cinema
HARVEYMILK/SEANPENN
na sua luta política pelo
reconhecimento da diferença
contemplativo (e, por vezes, companhia de seguros, em 1970, até à sua
A política
autocontemplativo...) que até então não eleição para o board of supervisors da
lhe conhecíamos. Neste sentido, “Milk” cidade de São Francisco, em 1978. E, se o
pode ser visto como um regresso à olhar de Van Sant se quer, também ele,
linguagem do cinema clássico e, em militante, activamente comprometido com
particular, à linguagem política, engagé e a defesa de uma causa justa, ele não deixa
da diferença
activista que marcou o cinema americano por isso de preservar a sua objectividade,
dos anos 70. chegando mesmo a mostrar como a
Primeiro biopic em sentido estrito defesa da diferença não pode deixar de
realizado por Van Sant (“Últimos Dias” engendrar a sua própria segregação
era mais uma meditação poética do que (veja-se a cena em que Anne
um filme biográfico sobre Kurt Cobain), Kronenberg/Alison Pill, a nova directora
“Milk” retrata a vida e obra de Harvey de campanha de Milk e a primeira mulher
Milk/Sean Penn (1930-1978), o primeiro a entrar na sua sede, é repelida pela
O RECONHECIMENTO
homossexual confesso a ter sido eleito entourage do candidato devido à sua
para um cargo político na Califórnia e um diferença sexual).
DOS DIREITOS CIVIS
dos principais responsáveis pelo Retrato histórico de um espaço e de um
DOS HOMOSSEXUAIS É O
reconhecimento jurídico dos direitos civis tempo passados (os EUA dos anos 70),
PONTO FOCAL DESTE FILME
dos homossexuais nos EUA. Através de “Milk” é também um retrato histórico de
uma série de flashbacks articulados a um espaço e de um tempo presentes (os
Texto de Vasco Baptista Marques partir de uma cena primitiva comum EUA de 2009). Com efeito,
JJJJJ
(aquela em que Milk antecipa a caracterizando o seu protagonista como
QUASE SEMPRE a meio caminho eventualidade do seu assassínio e regista o uma figura capaz de instaurar o
entre o cinema experimental e o cinema seu testamento político num gravador nas reconhecimento da diferença, acentuando
clássico, a obra de Gus Van Sant MILK vésperas da sua morte), o filme vai a sua capacidade de mobilização e a sua
radicalizou a sua linguagem ao longo dos deGusVanSant detalhando, com a ajuda de imagens de mensagem de esperança e tolerância, Van
últimos anos. De facto, depois das (EUA) arquivo que Van Sant se diverte a Sant parece querer ver em Milk um
aproximações ao mainstream de “O Bom com Sean Penn, James falsificar e num tom que tende sempre um profeta de Obama. Eu escolheria outras
Rebelde” (1997) e “Descobrir Forrester” Franco, Josh Brolin pouco para a canonização instantânea, personagens para fazer os papéis de São
(2000) e, sobretudo, da assimilação do DRAMABIOGRÁFICO alguns dos principais episódios do João Baptista e Cristo, mas isso não me
trabalho do húngaro Béla Tarr, o cinema M/12 percurso do seu protagonista, desde a sua impede de dizer que, exegese bíblica à
de Van Sant ganhou um cunho vida como simples trabalhador de uma parte, “Milk” é um belo filme.
20 31 Janeiro 2009 Expresso