10 PRIMEIRO CADERNO Expresso, 31 de Janeiro de 2009
GOVERNOS DE GESTÃO
Eu fiz muito... ... e eu também
Sócrates foi o mais produtivo do Governo de gestão de Guterres. É responsável por 1/3 das iniciativas legislativas
Uma dramática derrota nas ur- Sampaio. Dali até à sua substitui- nistério do Ambiente na altura a celeridade do licenciamento Durão Barroso e garante que elevada produção legislativa de
nas não quebrou a inspiração le- ção, por força de um processo liderado pelo actual primei- da zona comercial de Alcoche- despachar alterações ao PDM Sócrates contrastaria com a do
gislativa do governo socialista, eleitoral que levaria o líder so- ro-ministro José Sócrates. O te, designada por Freeport e pe- “é como esvaziar um caixote” chefe de Governo. Da lavra ex-
então já de gestão, liderado por cial-democrata, Durão Barroso, ambiente seria responsável, em lo Decreto-Lei n.º 140/2002, de processos que pululam pela clusiva de António Guterres
António Guterres que em 102 ao poder, decorreriam 14 Conse- pouco mais de dois meses, por aprovado num tempo recorde Direcção-Geral de Ordenamen- apenas duas decisões: os despa-
dias fez aprovar 231 propostas le- lhos de Ministros e 231 decisões, 70 propostas, dos quais cons- de 55 dias. “Nunca visto”, garan- to do Território à espera de um chos que dariam aos funcioná-
gislativas. O ano 2001 estava por via de decretos-leis, decre- tam alterações aos Planos Direc- te o social-democrata José parecer. A pressão dos autarcas rios públicos o direito a goza-
prestes a terminar e o então lí- tos regulamentares, resoluções tores Municipais, acertos nas Eduardo Martins. O agora depu- nem sempre justifica tudo e re- rem tolerância de ponto no Car-
der socialista demitia-se a meio ou despachos. Zonas de Protecção Especial e tado social-democrata viria a conhece que o procedimento é naval e na Páscoa.
da tarde numa reunião com o Um terço destes diplomas se- nas Reservas Ecológicas e Agrá- ocupar uma secretaria de Esta- “pouco sustentável e aconselhá- Humberto Costa
Presidente da República, Jorge ria da responsabilidade do Mi- rias Nacionais. Nem todas com do do Ambiente no governo de vel” num governo de gestão. A hmcosta@expresso.impresa.pt
Sócrates
José Sócrates, bateria todos os
O “vício”
cos. Tem participação, com o mi-
seus parceiros de governo em nistro do Ambiente, Nobre Gue-
produtivo
matéria de produção legislativa.
do jogo
des, no processo Portucale, e é
Há mesmo um Conselho de Mi- autor do Decreto-Lei do Casino
nistros, em 7 de Fevereiro de de Lisboa. Mas Telmo Correia
2002, quase monopolizado por empenhar-se-ia na alteração da
assuntos do ambiente. Desde a Lei do Jogo, na concessão do ex-
A alteração da Zona resolução que determina a ela- O executivo de gestão clusivo da exploração de jogos
de Protecção Especial boração do Programa Nacional de Santana Lopes ficou de fortuna e azar na Península
de Alcochete não foi caso da Política de Ordenamento do marcado pelos polémicos de Tróia e ainda tem tempo pa-
único nos dois meses Território (“um instrumento casos Portucale e Casino ra fazer aprovar um decreto-lei
de gestão de Guterres fundamental para a organiza- de Lisboa que estabelece as regras da ex-
ção do território nacional”, refe- ploração das apostas mútuas
O decreto-lei que altera a Zona re-se no comunicado do Conse- O Governo da Santana Lopes nas corridas de cavalos.
de Protecção Especial na área lho de Ministros), até à aprova- não foi tão produtivo no período Mas a produção legislativa do
onde seria implantado o Free- ção do Plano de Pormenor da de gestão, mas nem por isso po- Executivo de Santana Lopes em
port, em Alcochete, foi aprova- Mouraria, em Beja, ou altera- de ser acusado de indolência. vésperas de ser substituído não
do a três dias das eleições que ções à delimitação da Reserva Em pouco mais de dois meses se poupou a esforços para pro-
fariam regressar o PSD ao po- Ecológica Nacional no municí- Santana aprovou 193 diplomas, mover algumas actividades in-
der. Mas quer antes, quer de- pio de Abrantes. com destaque para os casos dustriais, a maioria pela pena
pois desta aprovação, cuja celeri- Só nesta reunião na residên- mais polémicos dos diplomas do de Álvaro Barreto, responsável
dade tem suscitado as mais di- cia oficial do primeiro-ministro Casino de Lisboa e Portucale. pela pasta da Economia. Uma
versas críticas, foram muitos os o governo de gestão aprovou Telmo Correia, detentor da das empresas que mereceu a
diplomas do género aprovados 44 diplomas. Desta produção le- pasta do Turismo, não terá sido atenção do Executivo, ainda
em Conselho de Ministros. O Mi- gislativa, o ministério de José Guterresdemitiu-sea17deDezembrode2001esaiua6 o mais activo ministro do Execu- que em período de gestão, foi a
nistério do Ambiente, ocupado Sócrates é responsável por deAbrilde2002.SantanaLopesliderouumgoverno tivo de Santana Lopes, mas foi Plêiade, de José Oliveira Costa e
pelo actual primeiro-ministro mais de 60%. degestãode13deDezembrode2004a12deMarçode2005 de certeza um dos mais polémi- Dias Loureiro.
OS ÚLTIMOS CONSELHOS DE GUTERRES
Nunca se falou do Freeport
Os ministros do tempo de nistro da Administração Públi- po a fazer despachos normati-
António Guterres garantem ca, fala de uma “orientação ex- vos, sem verbas nem vontade.
que a palavra Freeport pressa” de António Guterres pa- Não é essa a memória de Cor-
nunca foi pronunciada ra que houvesse um “cuidado re- reia de Campos, que se lembra
em Conselho de Ministros dobrado” no que se levava a muito bem do dia em que Jorge
Conselho de Ministros, mas Cor- Sampaio, cheio de dúvidas acer-
A palavra Freeport nunca foi reia de Campos, ministro da ca do seu diploma sobre a ges-
pronunciada em Conselho de Saúde, recorda apenas a “reco- tão hospitalar, o enviou para o
Ministros, garante a generalida- mendação” para que não se pro- Tribunal Constitucional. O pare-
de dos antigos ministros de An- cedesse a nomeações. Já Rui Pe- cer dos juízes veio claro: “Desde
tónio Guterres. Ouvidos pelo Ex- na (Defesa) tem a certeza da que as justificações não sejam
presso para reconstituírem o realização de uma “reunião ex- absurdas”, não é por ser de ges-
que foram os últimos meses do traordinária, logo na altura do tão que um Governo se deve
mandato do antigo primeiro-mi- Natal”, na qual foram apresen- considerar impedido de tomar
nistro, todos eles coincidem que tadas as prioridades de cada Mi- qualquer iniciativa legislativa
o tema não tinha sequer que ser nistério. (ver pág. 11). A partir daí, conta
chamado àquelas reuniões. o ex-ministro da Saúde, “sen-
Aliás, então como agora, valia tia-me à vontade”. Ainda que,
a regra de ouro de cada minis- “Ficámosaapodrecer garante, não tivesse “peças le-
tro só se envolver na discussão
maisdetrêsmeses”,
gislativas essenciais”, levou tu-
de questões de uma área que
recordaRuiPena
do o que pôde para aprovação
não a sua se esta conflituar com em Conselho de Ministros.
a sua tutela. Esta versão é corroborada por
Não foi este o caso do único Fosse como fosse, todos con- Alberto Martins, que tem a certe-
decreto-lei relativo ao caso vergem que o Presidente da Re- za que nenhum ministro deixa
Freeport, o que redefiniu os li- pública era sempre consultado. para os seus sucessores aquilo
mites da zona de protecção es- Ou relativamente aos dossiês em que puder deixar a sua mar-
pecial do estuário do Tejo, apro- que, sendo aprovados, teriam ca — mesmo que apenas na pe-
vado a 14 Março. de ser promulgados por Jorge quena história legislativa do país.
Recorde-se: António Guterres Sampaio (ver textos pág. 6), ou Mas os estados de espírito va-
anunciou a sua demissão a 17 de em conversas particulares. Luís riaram consoante os protagonis-
Dezembro de 2001, na sequên- Braga da Cruz (Economia) e tas. José Lello, com a pasta da
cia da derrota do Partido Socia- Rui Pena, ambos há apenas cin- Juventude e Desportos, diz que
lista nas eleições autárquicas, co meses no cargo (haviam en- nunca abrandou o ritmo por-
mas a Assembleia da República trado no Governo na remodela- que tinha em mãos a organiza-
só seria dissolvida um mês de- ção efectuada em Julho de ção do Euro 2004, ao passo que
pois e as eleições parlamenta- 2001), foram alguns dos que se Capoulas Santos refere esse pe-
res antecipadas teriam lugar a aconselharam pessoalmente ríodo como de “descontracção,
17 de Março. O novo Governo com o PR. porque a pressão diminuiu”.
de Durão Barroso tomou posse Foi assim que Braga da Cruz Privilégios de quem tutelava a
a 6 de Abril de 2002. avançou com o seu pacote so- Agricultura. No Ambiente, re-
Foi, portanto, um período ex- bre energias renováveis e Rui zam as crónicas (ver texto aci-
cepcionalmente longo de transi- Pena travou a nova legislação ma), o ritmo era outro e bastan-
ção, perante o qual os ministros de reforma da Lei de Defesa Na- te mais frenético.
reagiram de modo diferente. cional. “Ficámos a apodrecer Cristina Figueiredo
Hoje, as memórias são já difu- mais de três meses», diz Rui Pe- e Luísa Meireles
sas. Alberto Martins, então mi- na, que passou o resto do tem- cfigueiredo@expresso.impresa.pt