Expresso, 31 de Janeiro de 2009 PRIMEIRO CADERNO 39
In Memoriam
1932-2009 Escritor, centrou-se nas classes médias americanas da província. Considerado pelo
seu amigo Philip Roth “o maior homem de letras do nosso tempo”. Ganhou dois Pulitzer
OBITUÁRIO
John Updike
António Maria Pereira
1924-2009 Advogado e antigo deputado à Assembleia
José Cutileiro
culo XXI e nascido quando o sé- dos Unidos — e descrições analí- da República pelo PSD. O sócio fundador da Sociedade
culo XX já estava bem entrado, ticas das vidas de homens e mu- de Advogados PLMJ foi presidente da Comissão Parlamentar
Updike parecia-se mais com a lheres daquelas classes, apanha- dos Negócios Estrangeiros entre 1991 e 1995, membro
J
ohn Hoyer Updike, que maioria dos grandes mestres do dos por vagas sucessivas de mo- do Comité Político da Assembleia Parlamentar da NATO
morreu de cancro do pul- século XIX do que com muitos dernidade. Os seus romances e, ainda, presidente da Secção Portuguesa “Direito e Justiça”.
mão num hospício de dos seus contemporâneos por mais conhecidos, os da tetralo- Autor de importantes trabalhos jurídicos, foi agraciado
Danvers, perto da casa ter obtido, ao mesmo tempo, gia do Coelho, espalham-se na com a Ordem de Cavaleiro, com a Legião de Honra, Mérito
em Massachusetts onde vivia há imenso sucesso popular e alta acção (e na escrita) entre os e Economia Nacional pela República Francesa e com
décadas com a sua segunda mu- apreciação crítica. Tal como al- anos sessenta e noventa. Juntan- a Condecoração de Mérito de Primeira Classe pela República
lher e cujo desaparecimento des- guns daqueles, de resto, a sua do-os num volume em 1995, es- Alemã. Dia 28, em Lisboa, de causa natural.
pertou uma torrente de elogios criatividade era prodigiosa. creveu no prefácio: “Apesar de Vermaisemwww.expresso.pt
de oficiais do mesmo ofício (ou Quando depois de aprendiza- variados e democráticos, os Es-
ofícios, porque Updike foi ro- gem de artes gráficas em Ox- tados Unidos não se oferecem fa-
mancista, novelista, contista, ford a revista “The New Yorker” cilmente ao ficcionista: o nicho
poeta, crítico literário, crítico de lhe publicou o primeiro conto, entre o fantástico e o corriquei- Fernando Amaral
arte e cronista de tudo e de na- em 1954, a veia literária já cele- ro parece estreito demais. Tal-
da, de todo o mundo e nin- brada na distinção dada à sua li- vez o puritanismo e espírito prá-
guém), incluindo um do seu ami- cenciatura em literatura inglesa tico dos primeiros colonos impu- 1925-2009 O Parlamento aprovou por unanimidade
go Philip Roth, que com ele par- em Harvard tornou-se prepon- sesse um peso enigmático sobre um voto de pesar pela morte do antigo presidente
tilhava a contradistinção de derante — e transbordante. Deci- a vida afectiva e a textura social da Assembleia da República, enaltecendo as suas “profundas
nem um nem outro terem rece- diu que iria publicar pelo menos da nação. A minimização das di- convicções humanistas”. Licenciado em Direito, militante
bido o Prémio Nobel, para indig- um livro por ano, meteu-se a es- ferenças de classe suprimiu um do PSD, é uma das referências da democracia portuguesa.
nação, todos os Outonos de há crever três páginas por dia e não dos elementos articuladores da Integrou também dois Executivos liderados por Francisco
uns vinte anos para cá, dos res- se afastou da meta que estabele- ficção europeia, e percepção Pinto Balsemão, como titular da pasta da Administração
pectivos fãs (mas Updike fez des- cera. Deixou-nos trinta roman- próxima e apreciativa da psicolo- Interna e como ministro adjunto. Dia 24, em Lamego,
sa fraqueza força, conferindo o ces, dez volumes de contos, uma gia das relações sexuais — tão de causa natural.
prémio a um distante alter ego, peça de teatro, nove colectâneas importante em romances france-
Henry Bech, escritor judeu de de poesia, dez volumes de en- ses e ingleses — tardou a che-
poucos livros, neurótico e fe- abundaram nesse sentido. Ha- saios e crítica, além de numero- gar-se às austeridades do Novo
meeiro, personagem recorrente via quem não gostasse da prosa sos artigos em jornais e revistas. Mundo. O personagem Harry > Fernando Bragança Gil (1927-2009), ‘pai’ e antigo director do
nalguns dos seus romances). de Updike — Norman Mailer dis- Nos ensaios, tratava de muitos ‘Coelho’ Angstrom foi o meu bi- Museu de Ciência da Universidade de Lisboa, em Lisboa, de
Roth declarou que ele fora o sera que ele só agradava a leito- temas, na ficção concentrou-se lhete de entrada na América doença pulmonar > Ramaswamy Venkataraman (1911-2009), oi-
maior homem de letras do nos- res que não entendiam nada de nas classes médias americanas que me rodeava. Valia mais a pe- tavo Presidente da Índia e membro do histórico Partido do Con-
so tempo, um tesouro nacional escrita — ou das suas ideias — de província de onde provinha e na contar o que via através dos gresso, em Nova Deli, de cancro > James Brady (1928-2009),
americano comparável ao escri- patriota, cristão praticante, a fa- que o fascinavam (gostava “do seus olhos do que o que via atra- lenda do jornalismo americano e autor de livros sobre a Guerra
tor do século XIX Nathaniel vor das guerras do Vietname e que é vivo, quotidiano, banal”). vés dos meus”. da Coreia, em Nova Iorque, de causa desconhecida > Bob May
Hawthorne, e que a sua morte do Iraque. Mas Mailer também Nos seus romances e contos figu- E olhar de pintor inscrevia tu- (1940-2009), actor que fez o papel de robô na série americana
era uma perda incomensurável já nos deixou e desde terça-feira ram cenas muito explícitas de se- do isso num grande quadro de “Lost in Space”, na Califórnia, de complicações cardíacas > La-
para a literatura americana. Ou- passada só se têm lido ou ouvido xo — prática que no fim dos Hopper, na América de onde santha Wickramatunga (?-2009), jornalista, defensor dos direi-
tros escribas de língua inglesa, boas lembranças. anos cinquenta deixara de levar John Updike dizia que vinha. tos humanos, editor-chefe do jornal independente “Sunday Lea-
dos dois lados do Atlântico, Embora tenha morrido no sé- escritores a tribunal nos Esta- Ver mais em Actual P7 der”, crítico do Governo do Sri Lanka, país onde foi assassinado