dinastia amis
maisinformaçãoemaeiou.escape.expresso.pt
actual@expresso.pt
O que aqui
se ensaia, da
forma mais
obtusa, é uma
o julgamento dos méritos próprios é qua- frase e transformar o livro, em última ins- camente escandaloso. Estende-se até ao su-
se sempre deturpado por insensatas ex-
prescrição
tância, num falhanço moral e criativo. Es- posto ‘eclectismo populista’ de Martin
pectativas genéticas. crito num registo que é um tour de force de Amis, cuja paixão por desportos de salão
Em Junho de 2008, a Macmillan publi-
absolutista
condescendência, “Amis & Son” é um in- (snooker, dardos) e por música popular é
cou “Amis & Son”, de Neil Powell. É o pri-
sobre a vida
transigente ataque frontal a tudo o que pudicamente impugnada como ‘impró-
meiro tratamento biográfico paralelo de Martin Amis representa. pria’ em alguém que pretende ser um escri-
Kingsley e Martin Amis; é, também, uma
literária
A aversão não é novidade, embora os mo- tor sério. Uma sinistra trilogia de ‘pês’
oportunidade desperdiçada. O esbanjamen- tivos o sejam. “Não gostar de Martin Amis” (prosperidade, permissividade e pop) é in-
to é particularmente lamentável porque o tornou-se um desporto nacional no Reino vocada para explicar a ‘privação cultural’
clã Amis foge ao habitual padrão dinástico: Unido, com regras tão esotéricas e aderen- sofrida por todos aqueles cujas calças, em
as reputações de ambos atingiram os mes- tes tão fanáticos como o críquete ou o hooli- alguma altura da sua vida, expressaram
mos picos canónicos. O objectivo crítico de ganismo. Muita dessa hostilidade vem de afecto pelos Beatles. O próprio estilo de
um trabalho comparativo deveria ser a res- uma leitura exageradamente literal do seu Amis é denegrido como uma espécie de ‘de-
posta a uma pergunta: como é que dois au- percurso ideológico — que muitos vêem co- mótico iletrado’; e duas páginas catastrofi-
tores com genes partilhados, programas es- mo um decalque do trajecto do pai: do so- camente bisonhas são gastas a tentar de-
téticos semelhantes e talentos relativamen- cialismo radical à misantropia reaccioná- monstrar o indemonstrável — que Martin
te nivelados vieram a produzir obras tão ria. Aproximadamente desde 1995, Martin Amis não tem graça.
radicalmente diferentes? Amis não pôde abrir a boca — fosse para Para os que acham que isto não é crítica
Decidindo que a narrativa básica da vida criticar o terrorismo islâmico ou para fazer construtiva, Powell oferece um trilho para-
de Kingsley (a insegurança de classe, o al- tratamentos dentários — sem ofender uma lelo, que poderia ter tornado Martin Amis
coolismo, o adultério, a pose iconoclasta classe demográfica inteira ou provocar a uma pessoa melhor e um escritor melhor:
que degenera num filistinismo genuíno, histeria regimentada da respectiva claque. o trilho de Neil Powell. Num momento ver-
etc.) já fora escrupulosamente esgotada pe- Powell circunda essa rota e escolhe em- dadeiramente surreal, Powell admoesta
la maciça “The Life of Kingsley Amis” brenhar-se por ofensas mais originais. O Martin Amis por este não ter respeitado
(2006), de Zachary Leader, e que Martin catálogo de coisas que o escandaliza é fran- Kingsley na sua autobiografia, tratando-o
exibe ainda demasiados sinais vitais para como um mero escritor, ou pior, como
ser sujeito à impertinência rigorosa do bió- uma personagem de ficção. É que Powell
grafo, Powell optou por partir de uma relei- também sofreu a morte de um progenitor,
tura atenta das obras, relegando as vidas
para um distante segundo plano. “Enormes seios, etc.”
mas teve o cuidado de escrever um sensí-
vel poema sobre o assunto.
Um veemente determinismo cultural O que é aqui ensaiado, da forma mais
fá-lo chegar a uma conclusão: pai e filho obtusa possível, é uma prescrição absolu-
foram prisioneiros das décadas que os for- tista sobre a vida literária: envolve uma
maram. Indelevelmente moldado pelos OsAmispassaramporPortugalem1955,depoisdeo educação estética específica, um estilo de
anos 60, Martin teve poucas hipóteses de primeiroromancedeKingsley,“LuckyJim”,terganhoo vida regrado, uma formação moral irre-
se tornar um escritor à altura do nome pa- SomersetMaughamAward,cujascondiçõesestipulavam preensível, risco ao lado, unhas limpas e
terno — e desperdiçou-as. A culpa é sua, queodinheirodoprémiofossegastonumaestadiade sapatos engraxados.
portanto, mas também é dos hippies. pelomenostrêsmesesnumpaísestrangeiro.Kingsley As biografias literárias costumam fracas-
O que começa como biografia, contudo, chegouaplanearumasequelapassadaemPortugal. sar, ou por quererem impor um determinis-
depressa se transforma num insólito bil- Fragmentosdoprojectosobrevivemnoromance“ILike mo excessivo, forçando a fusão entre vida e
dungsroman. Torna-se gradualmente apa- ItHere”;umadassecçõesdolivrorelataumaterrador obra, ou por degenerarem num papaguear
rente que o personagem central de “Amis passeiodemotaqueoprotagonistafazpeloEstoril de rumores escabrosos. A miopia candida-
& Son” é Neil Powell e que Neil Powell não conduzidoporumportuguês,queaproveitapara mente anacrónica de Neil Powell e a sua
está de todo satisfeito com o rumo que a praticaroseuatabalhoadoinglês:“Wouldyouliketo desbocada pedagogia inauguram novos
literatura — e, por inferência, o mundo — takeacerpofcerffeelater?”AfamíliaAmisinstalou-se conceitos de fracasso. “Amis & Son” tem
tomou a partir de 1963. O preconceito é juntodeinglesesexpatriados,masosreceiosdechoque valor como entretenimento — por todos os
tão abrangente, tão totalitário, que parece culturalderamlugaraumgradualamolecimento.Uma motivos errados. Mas tem, infelizmente,
coordenar cada página, pesar sobre cada cartadeKingsleyparaRobertConquestprovidenciao muito pouco a ver com Amis & Filho.
melhorsumáriodaestadia:“Sim,Portugaléondeestou.
Nãoénadamau,tendoemcontaqueé‘noestrangeiro’.
Diasquentes.Comidaumpoucocondimentada,mas
comestível.Álcoolemabundância.Mulherestão
perfeitasquetivedecultivarumaeficientearmadura
protectiva:cuidardobebé,brincarcomosrapazes,etc.,
deformaquejámalreparonaspelesperfeitas,poses
imponentes,enormesseios,etc.” R.C.
14 31 Janeiro 2009 Expresso
Page 1 |
Page 2 |
Page 3 |
Page 4 |
Page 5 |
Page 6 |
Page 7 |
Page 8 |
Page 9 |
Page 10 |
Page 11 |
Page 12 |
Page 13 |
Page 14 |
Page 15 |
Page 16 |
Page 17 |
Page 18 |
Page 19 |
Page 20 |
Page 21 |
Page 22 |
Page 23 |
Page 24 |
Page 25 |
Page 26 |
Page 27 |
Page 28 |
Page 29 |
Page 30 |
Page 31 |
Page 32 |
Page 33 |
Page 34 |
Page 35 |
Page 36 |
Page 37 |
Page 38 |
Page 39 |
Page 40 |
Page 41 |
Page 42 |
Page 43 |
Page 44 |
Page 45 |
Page 46 |
Page 47 |
Page 48 |
Page 49 |
Page 50 |
Page 51 |
Page 52 |
Page 53 |
Page 54 |
Page 55 |
Page 56 |
Page 57 |
Page 58 |
Page 59 |
Page 60 |
Page 61 |
Page 62 |
Page 63 |
Page 64 |
Page 65 |
Page 66 |
Page 67 |
Page 68 |
Page 69 |
Page 70 |
Page 71 |
Page 72 |
Page 73 |
Page 74 |
Page 75 |
Page 76 |
Page 77 |
Page 78 |
Page 79 |
Page 80 |
Page 81 |
Page 82 |
Page 83 |
Page 84 |
Page 85 |
Page 86 |
Page 87 |
Page 88 |
Page 89 |
Page 90 |
Page 91 |
Page 92 |
Page 93 |
Page 94 |
Page 95 |
Page 96 |
Page 97 |
Page 98 |
Page 99 |
Page 100 |
Page 101 |
Page 102 |
Page 103 |
Page 104 |
Page 105 |
Page 106 |
Page 107 |
Page 108 |
Page 109 |
Page 110 |
Page 111 |
Page 112 |
Page 113 |
Page 114 |
Page 115 |
Page 116 |
Page 117 |
Page 118 |
Page 119 |
Page 120 |
Page 121 |
Page 122 |
Page 123 |
Page 124 |
Page 125 |
Page 126 |
Page 127 |
Page 128 |
Page 129 |
Page 130 |
Page 131 |
Page 132 |
Page 133 |
Page 134 |
Page 135 |
Page 136 |
Page 137 |
Page 138 |
Page 139 |
Page 140 |
Page 141 |
Page 142 |
Page 143 |
Page 144 |
Page 145 |
Page 146 |
Page 147 |
Page 148 |
Page 149 |
Page 150 |
Page 151 |
Page 152 |
Page 153 |
Page 154 |
Page 155 |
Page 156 |
Page 157 |
Page 158 |
Page 159 |
Page 160 |
Page 161 |
Page 162 |
Page 163 |
Page 164 |
Page 165 |
Page 166 |
Page 167 |
Page 168 |
Page 169 |
Page 170 |
Page 171 |
Page 172 |
Page 173 |
Page 174 |
Page 175 |
Page 176 |
Page 177 |
Page 178 |
Page 179 |
Page 180 |
Page 181 |
Page 182 |
Page 183 |
Page 184 |
Page 185 |
Page 186 |
Page 187 |
Page 188 |
Page 189 |
Page 190 |
Page 191 |
Page 192 |
Page 193 |
Page 194 |
Page 195 |
Page 196 |
Page 197 |
Page 198 |
Page 199 |
Page 200 |
Page 201 |
Page 202 |
Page 203 |
Page 204 |
Page 205 |
Page 206 |
Page 207 |
Page 208 |
Page 209 |
Page 210 |
Page 211 |
Page 212 |
Page 213 |
Page 214 |
Page 215 |
Page 216 |
Page 217 |
Page 218 |
Page 219 |
Page 220 |
Page 221 |
Page 222 |
Page 223 |
Page 224 |
Page 225 |
Page 226 |
Page 227 |
Page 228 |
Page 229 |
Page 230 |
Page 231 |
Page 232 |
Page 233 |
Page 234 |
Page 235 |
Page 236 |
Page 237 |
Page 238 |
Page 239 |
Page 240 |
Page 241 |
Page 242 |
Page 243 |
Page 244 |
Page 245 |
Page 246 |
Page 247 |
Page 248 |
Page 249 |
Page 250 |
Page 251 |
Page 252 |
Page 253 |
Page 254 |
Page 255 |
Page 256 |
Page 257 |
Page 258 |
Page 259 |
Page 260